terça-feira, 15 de junho de 2010

mais um dia de jogo

Das vezes que eu presenciei um mundial na infância morava no interior. Provincianismo e lentidão do tempo eram constantes e não variáveis. Eram adereços do percurso da vida, quase que elementos naturais da paisagem. Por mais q eu sentisse um espírito contagiante soprando pelas ruas onde crianças corriam descalças não era possível sentir a verdadeira magnitude do que o evento provoca no espírito nacional, na nossa cultura brasiliana.

Se queres sentir o sabor do nosso universo mental, do ethos brasileiro em relação a uma copa do mundo deve-se estar na grande cidade. Na capital, nas cortes, na metrópole.

É ali; no caos da urbes que o espírito do que realmente isto representa é exumado. É mais interessante vivenciá-lo do que compreendê-lo.

Sentir o quanto nos empenhamos em expectativas de felicidade que emanam de uma bola e o quanto isso, pode se refletir em um baixar de poeira das obras. Em um apagar das luzes de um banco ou na desertidão de uma Afonso Pena ao meio dia. É no afugentar dos pombos parasitas do centro que não conseguem pousar nos antes tranqüilos telhados sujos das casas de meretrício devido ao espanto das constantes salvas de rojão e do soar de trombetas que custam...5.99R$.

No silenciar dos ônibus em plena metrópole. No congelar dos relógios de ponto em uma prefeitura. É no fechar das lojas do Oiapoque que sentimos o impacto do evento.

É no fim da seriedade dos mais sovinas dos chefes,

É no ligar das televisões em uníssono, é No desaparecer do Paulo. É no rush às 11 da manha. É no desespero por algo q naqueles instantes de expectativa são aceitos como a prévia da coisa mais importante do mundo.
Incrivelmente, nós com tantos problemas conseguimos rearranjar o jogo como “a prioridade urgentíssima”! Todo o resto perde o sentido e importância. Em algumas horas somos o povo mais rico do mundo, com melhor auto-estima e acima de qualquer miséria. Tudo isso porque se acende um gigantesco holofote dos céus sobre o estádio no qual, nossa atenção se converge. A exemplo de um palco de teatro que iluminado, deixa tudo a sua volta escuro e sem poder ser visto, o mesmo acontece aos olhos do espectador brasiliano que enxerga nas quatro linhas daquele jogo um ponto claro e visível em meio um oceano de escuridão em volta.

Os problemas estão no escuro. A falta de dinheiro está no escuro,A carência de proteína no prato, a bala perdida, a câmara imoral, o pedinte, a gasolina de 3.40 o litro, o lixo na rua, a fila do pronto socorro e a feiura de 50% do nosso povo estão no escuro.

As traves estão às claras, o cronometro esta as claras, a bandeira esta as claras. O copo na mesa está às claras.

A primeira copa que presenciei enquanto já morava em uma capital foi a de 1998. época difícil e de transições;;mas fodas; isso já é um lance pessoal. A questão é q me encantei o vazio instantâneo de uma grande cidade. Foi uma evacuação mais rápida que a de um ataque aéreo. Nosso povo, tão habituado a desorganização e a cordialidade acima das regras, não tem a disciplina para seguir regras de vacuaçao ou o sinal de um alerta anti aéreo com tamanha eficiencia. Mas, consegue em marcha sair de seu canteiro de obra ou seu escritório em um dia sem ônibus e chegar em casa antes do tocar dos hinos no campo. E o impressionante ´e que fazem esta marcha em meio a uma cidade caótica e entulhada do som de buzinas chiando com os rostos carregados de sorriso.

Israelenses são preparados para evacuar seus locais de trabalho em minutos quando ouvem um alerta de Scud. Saem entoando preces em meio o disparar de coração. Saem com medo e com olhar de pânico.

Um japonês cumpre a ordem de evacuação de uma cidade ou ate de um arranha céus ao ouvir a sirene de terremotos. Ele sai ordenadamente. disciplinarmente . e coma cabela baixa.Olhar genuflexo e piedoso; quase que resignado com o destino dos fatos. todos seguem seu curso com o rosto truncado. Tristonho.

o brasileiro cumpre seu esvaziamento com ordem risonha. Com rostos felizes e a cara de satisfação.

a identidade da nossa matriz sócio cultural pode ser vista aí. Somos o povo q não tem estruturas para se mobilizar para o confronto, a contestação ou a ideologia. Não nos mobilizamos para a rigidez ou para a ordem. Nem mesmo para desafiar da ordem.

mas, nos mobilizamos para ser felizes. Somos disciplinados festeiros e não nos damos o direito de rumar para a tristeza. É a espécie perfeita modelada para dominar o mundo pois, não sofre. Ou não consegue farejar o sofrimento q ela degusta insípidamente do prato que está a sua mesa.